Curador Wilson Lázaro escolheu 80 obras que mostram a faceta esportista do artista
Um artista em constante movimento. Atento às marés que movem as paixões humanas mesmo internado em um manicômio (a Colônia Juliano Moreira, no Rio).
Bispo também será homenageado na Bienal de São Paulo, a partir de 7 de setembro. "A Bienal conta com 340 obras dele. Destas, sete foram restauradas. Cinco são inéditas. E uma das inéditas, um carro, com revistas, foi a grande surpresa", conta o curador. "Junto com suas obras foram encontradas revistas pornôs. Isso muda tudo. As pessoas sempre o colocaram como uma pessoa assexuada, que só teve um amor platônico. Mas a revista estava dobrada em determinadas páginas. Sinal de que foi lida sim."
Na maior exposição que ele já ganhou no exterior, parte da programação do London 2012 Festival, que levou à capital inglesa a obra de artistas de todo o mundo para celebrar os Jogos Olímpicos, o que o público do mundo todo está vendo é exatamente esta faceta esportista de Bispo do Rosário.
Obras de Arthur Bispo do Rosário
Detalhe de obra de Bispo do Rosário que vai à Bienal
Máquina de fazer cabelo (Detalhe) – bordado sobre tecido
Inédito também é o fato de a exposição no V&A não ter um catálogo. Em vez disso, o livro Arthur Bispo do Rosário - Século XX, com organização de Lázaro, vai ser relançado, com 26 obras novas, e texto de Luis Pérez-Oramas, curador da Bienal.
Curiosidades
Bispo era assexuado, mas suas anotações obsessivas dos nomes das estagiárias da enfermaria e sua coleção de revistas pornográficas provam o contrário.
Bispo também nunca tomou remédios e tinha total consciência de sua condição de paciente mental, chegando a ironizar a psiquiatria.
Cadernos do artista encontrados no acervo mostram anotações detalhadas de sua rotina no manicômio. Ele narra conversas com enfermeiros, dá detalhes de uma ferida no dedo, cataloga notícias de jornal --em especial sobre crimes-- e mantém um extenso inventário dos materiais que conseguia traficar para o hospital ao criar suas peças.
Uma das obras mais enigmáticas do artista, um estandarte em que ele borda um texto religioso, foi descoberta agora.
"Todos achavam que isso fosse um delírio, mas é uma propaganda", diz Lázaro. "Ele tinha um pensamento para fazer a obra, olhava para a imprensa como fonte de realidade para tudo."
Essas descobertas recentes reforçam a reabilitação de Bispo do Rosário, que aos poucos perde a aura de louco e ganha o reconhecimento de um artista contemporâneo singular de sua época.
Sua caixa de música, um estojo de madeira cheio de papel picado, em que a canção seria o som do papel soprado no ar, lembra a arte conceitual. Seus papéis de bala são precursores de Beatriz Milhazes. Seus estandartes feitos de fórmica colorida lembram o construtivismo.
"Nossa sociedade precisa da loucura para se excluir dela", diz Pérez-Oramas. "Mas nesse ato de exclusão, acaba exibindo a sua própria imagem".
"Ainda sinto muita loucura... mas sobre todos os pontos de vista vou cada dia, cada vez melhor!"
"Eu não quero me libertar totalmente da loucura porque eu quero ter o direito de dizer o que penso!"
Arthur Bispo do Rosário viveu recluso por meio século devido ao diagnóstico de esquizofrenia-paranóide e morreu a 20 anos, mas sua obra atravessou os muros da instituição psiquiátrica e obteve reconhecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário