Sobre as Sombras na Aquarela

Tudo começou com as nuvens.

A ideia surgiu da necessidade de mostrar a evolução de uma pesquisa feita sobre monocromia através da técnica da aquarela e colagem.

Foi à partir do meu olhar nas nuvens que surgiu o "momento sombras na aquarela". Após a escolha do suporte, as imagens começaram a brotar em minha mente de forma aleatória, de modo claro e objetivo, facilitando o desenvolvimento do trabalho. O fundo branco do papel, muitas vezes em destaque, realça as nuances e sobreposições das camadas, contrastando tons claros e escuros, assim como a luminosidade, algumas vezes oscilante, mais ou menos intensa, que brinca, sugerindo formas, movimentos e até mesmo sensações, destacando as características da aquarela aliada à colagem.

As inúmeras possibilidades que o tema oferece, associadas à técnica, tráz como resultado a simplicidade da proposta que, destacando a cor pura, em contraste com o papel, evidencia um grande prazer em criar.

Aline Hannun

14 de maio de 2013

Museu Afro Brasil apresenta "Modernidade"



José Pancetti
 
Mostra no Afro Brasil exibe início do modernismo na Bahia

Na tela de José Pancetti, o escritor e colecionador Odorico Tavares aparece retratado com óculos de aros vermelhos e uma camisa dividida em campos de cor amarelos e alaranjados, demarcados com certa rigidez geométrica.

Num claro contraste, Tavares, que morreu em 1980, descreveu o artista como "romântico inveterado", de "alma chapliniana de desajustado e de amoroso, latino nos exacerbamentos, muitas vezes violento nos amores".

Violentas ou não, as relações de Tavares com artistas que conheceu --e aos quais chegou a dedicar um livro de poemas-- estão por trás da coleção que ele construiu.

Um grande recorte de obras de Pancetti, Candido Portinari, Emiliano Di Cavalcanti e estrangeiros como Pablo Picasso e Joan Miró, todos na coleção de Tavares, está agora no Museu Afro Brasil.



Leda Tavares - Candido Portinari - 1948

Entre os anos 1940 e 1960, Tavares, pernambucano que foi a Salvador dirigir os Diários Associados a convite de Assis Chateaubriand, colecionou os maiores nomes da arte moderna que se firmava no Brasil, além de fomentar uma revolução plástica na Bahia.



Di Cavalcanti

Ele esteve por trás da formação do Museu de Arte Moderna em Salvador e lançou figuras como Pierre Verger, que fotografou suas reportagens na revista O Cruzeiro.

"Seu olhar sempre foi a modernidade", diz Emanoel Araújo, diretor do Afro Brasil e curador da mostra. "A arte na Bahia ainda era acadêmica, e ele criou essa ruptura" figurativo e abstrato.

Telas como Endomingada e Menina com Flores, de Portinari, dividem espaço com paisagens de Alfredo Volpi e retratos de Pancetti. Mas também estão lá, marcando a travessia do figurativo para a abstração, trabalhos de Antônio Bandeira, Manabu Mabe e Flávio Shiró.




Endomingada - óleo s. madeira - década de 40 - Candido Portinari

Lado a lado, Cais, de Bandeira, em que Tavares enxergou as cores do Ceará misturadas às de Paris, e Tropical, de Shiró, causam certa reverberação no espaço, com traços e gestos que parecem ecoar de uma para a outra.

 

Cais - Antônio Bandeira - 1959 - obra que está na mostra

Também na escultura há certa ressonância entre as obras em ferro forjado de Mário Cravo Júnior e Francisco Stockinger, que junta metal e madeira na figura de uma mulher híbrida, seu corpo feito de texturas contrastantes.
 


S/T - mista - sd - Mário Cravo Júnior

Essa mesma aspereza metálica ressurge nas vistas baianas de Poty Lazarotto, que gravou em metal as paisagens de Salvador, como os veleiros atracados na enseada e a topografia acidentada dos telhados do casario.

Mais exuberantes, as gravuras de Miró renunciam à realidade e se ancoram numa iconografia única, a imaginação do artista a serviço da criação de um novo mundo mergulhado em azul e povoado por criaturas insólitas.




Miró

Sobre Odorico Tavares

Nascido em Timbaúba (PE), Odorico passou a juventude em Recife e, em 1942, mudou-se para Salvador por motivos políticos, quando atuava como secretário do jornal Diário de Pernambuco. Na trincheira jornalística, afinou-se com a oposição aos representantes locais da ditadura do Estado Novo, integrado à militância de esquerda e às ideias de Gilberto Freyre. Seu universo de amigos incluía Álvaro Lins, Aníbal Fernandes, Freyre, Joaquim Cardozo, Mauro Mota, Odilon Ribeiro Coutinho e João Cabral de Melo Neto, entre outros.

Em 1934, editou a revista literária Momento, aproximando-se de escritores como: Manuel Bandeira, Mario de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, Gilberto Amado, José Lins do Rego, Jorge Amado e Lúcio Cardoso. Escrito em parceria com Jurema, 26 poemas marcou sua estreia na poesia. Em 1939, lançou A sombra do mundo, mas, a partir da segunda metade da década de 40, deu ênfase ao trabalho de jornalista, realizando históricas reportagens para a revista O Cruzeiro. À frente do Diário de Notícias, em Salvador, manteve a coluna Rosa dos Ventos e criou um suplemento cultural de vanguarda, no qual os jovens Glauber Rocha, Paulo Gil Soares e Caetano Veloso publicaram críticas.

Cúmplice das aventuras culturais de Assis Chateaubriand, o magnata dos Associados, Odorico Tavares assumiu um relevante papel na divulgação dos artistas nordestinos. Como estimulador e colaborador, contribuiu para a criação do Museu de Arte Moderna (MAM) da Bahia e dos museus regionais de Feira de Santana (BA) e Olinda (PE). Em artigos e reportagens deu respaldo aos artistas do Modernismo e das gerações dos anos 40, 50 e 60, realçando, em especial, o valor estético dos quadros de Pancetti. Fez históricos perfis do amigo Dorival Caymmi, do cordelista Cuíca de Santo Amaro e de outros personagens míticos da Bahia, sem se esquecer do maracatu, do frevo e da religiosidade de sua terra de origem.

Sobre a coleção

A qualidade da coleção de Odorico Tavares e a paixão a que a ela devotava fez com que ele encomendasse ao arquiteto Diógenes Rebouças o projeto de uma casa para abrigá-la. Esse belo projeto, implantado na escarpa do morro Ipiranga, num bairro litorâneo de Salvador, possuía uma galeria ao rés-do-chão da rua de entrada e um grande salão que se desenvolvia em um plano inferior, acompanhando a topografia do terreno. “Dessa forma, esses planos diferenciados criavam um cenário magnífico para abrigar a coleção de arte barroca, a imaginária brasileira e o mobiliário dos séculos XVIII e XIX, bem como a galeria do mezanino e a do salão de baixo, com a coleção de arte moderna, de onde se tinha uma visão panorâmica da casa", descreve Emanoel Araujo.

Serviço

Exposição "Modernidade - Coleção de Arte Brasileira Odorico Tavares".

Onde:
Museu Afro Brasil - Av. Pedro Álvares Cabral, s/n - Parque Ibirapuera - Portão 10
Tel. 3320-8900

Quando: de terça a domingo, das 10h às 17h

Quanto: Gratis




 

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